Com a idade vem a sabedoria. Essa é a boa notícia. Mas, a idade, infelizmente, também traz coisas menos desejáveis, incluindo a perda óssea. Logo que o esqueleto humano atinge sua massa óssea máxima, em algum momento entre 20 e 30 anos de idade, a taxa de perda óssea começa a exceder a de formação. Embora este processo fisiológico seja uma parte inevitável do envelhecimento, ele pode ser retardado, para evitar o desenvolvimento da osteoporose, uma doença óssea que, atualmente, afeta mais de 10 milhões de americanos com idade superior a 50 anos.
O potencial dos suplementos nutricionais, para aumentar a taxa em que o cálcio é incorporado nos ossos em adultos mais velhos, é de particular interesse para os médicos. Como uma deficiência de vitamina D resulta em ossos mais fracos (mais conhecidos como raquitismo em crianças e osteomalácia em adultos), é óbvio que o aumento da ingestão de vitamina D resultaria em um esqueleto mais forte. De fato, a suplementação com vitamina D tem sido muito importante na prevenção e tratamento da osteoporose há várias décadas. Pode parecer surpreendente, então, que nem um recente ensaio clínico randomizado, nem uma meta-análise em grande escala da literatura tenha encontrado qualquer evidência de um benefício para a suplementação de vitamina D na densidade mineral óssea.
Mas, antes de jogar fora seu frasco de suplemento de vitamina D, use aquela sabedoria que você conquistou com a idade e tome nota dos resultados recentemente publicados, de um estudo de coorte prospectivo, sobre o relacionamento entre os alimentos lácteos e a perda óssea. Sahni e colegas relatam que lácteos específicos (isto é, leite, iogurte e queijo) demonstram um efeito protetor contra a perda óssea. A vitamina D, ao que parece, pode ser mais uma jogadora de equipe, do que uma individualista, trabalhando melhor em combinação com um grupo ímpar de nutrientes – incluindo cálcio, fósforo e proteínas de alta qualidade – fornecidos por alimentos lácteos.
É hora de uma reforma
O esqueleto humano deveria ter seu próprio show no GNT, porque está sempre passando por um projeto de renovação. O remodelamento ósseo, processo de liberação (ou reabsorção) de osso antigo e formação de osso novo, ocorre ao longo do ciclo de vida, e é essencial para preservar a força do esqueleto e manter a homeostase do cálcio e de outros minerais em todo o corpo. No entanto, à medida que os seres humanos envelhecem, cada evento de remodelação resulta em mais perdas do que produção – a taxa em que o osso é reabsorvido por células chamadas osteoclastos ultrapassa a taxa em que é formado por células chamadas osteoblastos. Este processo é ainda mais acelerado em mulheres passando pela menopausa, nas quais a diminuição dos níveis de estrogênio está associada a taxas aumentadas de reabsorção óssea.
No pico de massa óssea, a estrutura do osso é, muitas vezes, descrita como semelhante a uma estrutura de favo de mel. À medida que o osso envelhece, ele começa a parecer mais uma teia de aranha, com orifícios maiores, nos locais onde os minerais foram liberados para a circulação. Não é necessário ser um engenheiro estrutural para entender por que os buracos maiores e o menor conteúdo mineral tornam os esqueletos mais fracos e mais frágeis.
Embora não seja possível manter o esqueleto mais denso até a sua aposentadoria, a perda óssea relacionada à idade não precisa avançar para a osteoporose. A osteoporose é uma doença óssea, caracterizada por densidade mineral muito baixa do osso, e associada a um risco aumentado de quedas e fraturas. A International Osteoporosis Foundation estima que cerca de 10 milhões de americanos e centenas de milhões de pessoas em todo o mundo sofrem de osteoporose. Se a doença pode ser prevenida, por que sua incidência é tão alta?
Um motivo óbvio é que muitas populações não estão comendo nutrientes suficientes que ajudam a manter os ossos. A formação dos ossos requer cálcio, portanto, a consequência é que dietas baixas neste mineral e em vitamina D, hormônio responsável pela absorção de cálcio, estariam associadas a uma saúde óssea precária. As diretrizes dietéticas atuais, dos EUA, recomendam que as mulheres com mais de 50 e os homens com mais de 71 anos consumam 1200 mg de cálcio e 800 UI (unidades internacionais) de vitamina D por dia. Entretanto, dados recentes indicam que a maioria dos americanos nessas faixas etárias consomem quantidades menores de ambos os nutrientes. A melhor saúde óssea poderia ser tão simples quanto tomar um suplemento diário?
O persistente D
A resposta curta a esta pergunta é, infelizmente, não. Os suplementos de cálcio, de fato, mostram um efeito protetor sobre a perda óssea, suprimindo o turnover ósseo em, aproximadamente, 20% e melhorando a sua densidade. No entanto, a segurança da suplementação com cálcio foi questionada, e numerosos estudos relatam um risco aumentado associado com suplementos de cálcio para ataque cardíaco e acidente vascular cerebral. Com uma relação pouco clara entre suplementação de cálcio e saúde cardiovascular, muitos pesquisadores e clínicos recomendam, ao invés disso, atender aos requisitos diários, exclusivamente, através da dieta. Infelizmente, os resultados de estudos que analisaram a relação entre ingestão dietética de cálcio e saúde óssea também são conflitantes – embora a densidade óssea tenha apresentado pequenas melhorias, atingir o nível recomendado de 1200 mg de cálcio na dieta não teve associação com o risco de fratura.
Os resultados da pesquisa sobre suplementação de vitamina D são igualmente desconcertantes. A vitamina D não é um mineral incorporado aos ossos, mas é um hormônio responsável por aumentar a absorção intestinal de cálcio. A digestão com cálcio é bastante complicada, e nem todo o cálcio consumido em alimentos (ou suplementos) será absorvido. Na sua forma metabolicamente ativa (referida como calcitriol), a vitamina D influencia a expressão da proteína de ligação ao cálcio, que é responsável pelo transporte ativo de cálcio dos intestinos para a circulação (precisamente onde o cálcio precisa estar para ser transferido aos ossos). Embora um estudo de controle randomizado de suplementação de vitamina D, em 230 mulheres na pós-menopausa, com menos de 75 anos de idade, tenha descoberto que os grupos suplementados, realmente, aumentaram a absorção de cálcio, a suplementação não foi associada a melhorias na densidade mineral óssea ou menor risco de queda em comparação com o grupo placebo. Essas descobertas são ecoadas por uma revisão sistemática da literatura sobre os efeitos da suplementação de vitamina D na massa óssea. Revisando 23 estudos envolvendo pouco mais de 4000 participantes (92% dos quais eram mulheres na pós-menopausa), Reid e colegas relataram que o número de resultados positivos (ou seja, com densidade óssea melhorada) não era muito melhor do que o que seria esperado sem a suplementação.
Uma possível explicação para esses achados é que a suplementação de vitamina D pode ser eficaz na absorção de cálcio do intestino para o sangue, mas tem pouca influência na deposição de cálcio nos ossos – isto é, na promoção da mineralização óssea. Esta perspectiva ajuda a entender porque a insuficiência de vitamina D pode predispor os indivíduos à osteoporose, limitando a quantidade de cálcio disponível para fazer um osso novo, enquanto que os suplementos de vitamina D fazem pouco para melhorar a densidade óssea.
Melhor Juntos – Leite e Vitamina D
A vitamina D sozinha pode não ser muito eficaz para a saúde óssea, mas e se os suplementos de vitamina D estivessem trabalhando com outros nutrientes? Uma equipe de pesquisadores de Harvard, da University of Massachusetts e do Institute for Aging, em Boston, investigaram se a suplementação de vitamina D teria alguma influência na associação entre ingestão de lácteos e densidade óssea. Para isso, eles utilizaram dados do Framingham Osteoporosis Study, um ramo do famoso Framingham Heart Study. Este estudo incluiu duas medições de densidade mineral óssea (separadas por quatro anos) do colo do fêmur (trocânter), coluna lombar e rádio, permitindo rastrear mudanças longitudinais na massa óssea em mais de 600 homens e mulheres. O estudo de Framingham também forneceu informações alimentares sobre a ingestão semanal de leite, iogurte, queijo e creme, permitindo uma análise de produtos lácteos específicos e densidade óssea.
Os autores do estudo criaram a hipótese de que a ingestão de todos os produtos lácteos, exceto o creme, seria associada à maior densidade mineral óssea e menor perda óssea. Eles especularam ainda que os benefícios dos produtos lácteos sobre a saúde óssea seriam maiores naqueles indivíduos que tomavam suplementos de vitamina D. Eles ficaram surpresos ao não encontrar uma associação significativa entre a ingestão de lácteos, quantificada como porções por semana, e a densidade mineral óssea. No entanto, ingestões mais altas de leite, leite + iogurte e leite + iogurte + queijo foram associadas à maior densidade óssea na coluna lombar em indivíduos com status adequado de vitamina D.
Mas, o que há nos lácteos que “desperta” o melhor na vitamina D? O cálcio é certamente parte da história. Mas, estudos prévios que compararam as alterações da massa óssea com suplementação de cálcio, com os suplementos de cálcio e vitamina D, descobriram que os efeitos são indistinguíveis, sugerindo que a vitamina D teve muito pouco efeito, quando ingerida apenas com cálcio. Além do cálcio, os produtos lácteos também fornecem proteínas bioativas, que estão implicadas na formação óssea. Por exemplo, o fator de crescimento semelhante à insulina tipo 1 (IGF-1), um hormônio que (como o nome sugere) desempenha um papel no crescimento ósseo em crianças e adolescentes, também está implicado na mineralização óssea em adultos. Além disso, as proteínas (caseínas) dos lácteos ligam o cálcio e o fósforo, fornecendo esses dois minerais de construção óssea ao mesmo tempo. O fósforo promove a mineralização óssea e, assim, aumenta as chances de que o cálcio absorvido chegue ao esqueleto. Os alimentos lácteos precisam de vitamina D suficiente para garantir a absorção ótima de cálcio, e a vitamina D precisa de nutrientes lácteos para que o cálcio absorvido seja transferido para o esqueleto.
Colocando à prova
Os resultados do estudo de Framingham indicam que a suplementação de vitamina D pode, de fato, ser importante para a saúde óssea, mas apenas quando administrada com outros nutrientes. O próximo passo será a realização de ensaios controlados randomizados (o padrão-ouro para avaliar a eficácia de uma intervenção) que examinam alimentos lácteos específicos, com vários níveis de suplementação de vitamina D. Também será importante avaliar outros resultados clínicos de osteoporose, além da densidade mineral óssea, tal como o número de quedas ou fraturas. Aqui, resta a esperança de que a maioria de nós, que lê isso agora, possa colher os benefícios deste tipo de pesquisa
Fontes:
Por: Lauren Milligan Newmark na SPLASH! milk science update: edição de junho de 2017
- Sahni S, Mangano K.M., Kiel D.P., Tucker K.L., Hannan M.T. 2017. Dietary intake is protective against bone loss in older vitamin D supplement users: the Framingham Study. Journal of Nutrition 147: 645-652.
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